segunda-feira, 27 de maio de 2013

Cerveja



Inspirado em um copo cheio qualquer, por aí...


É isso. A noite quieta. O ruído do notebook e os coolers da sua base. E você.

Não tenho mais companhia agora. Tenho apenas o calor do meu corpo, os pensamentos que oscilam o meu humor, desejos de me expressar por meio da escrita, e seu gosto meio amargo e espumante. Você.

Não quero ser politicamente correto agora. Não me interessa o que pensam de mim. Já pintei muitas paredes e quadros com todo o cuidado para não ofender os olhos de ninguém.

Agora, estou entre paredes, as mesmas da minha infância. O que restou apenas foram as cortinas beges com estranhos desenhos de pantufas, que meus pais me deixaram escolher quando tinha apenas 8 anos. O resto veio depois, com o tempo, com as mudanças. Tudo bem, me sinto aconchegado no colo do meu próprio eu.

Já me senti estático tantas vezes. Mesmo caminhando, correndo. Ou parado de fato, como agora. Já chorei por isso, reclamei, desabafei de todas as formas. O engraçado é que nenhuma delas foi com a sua companhia. Aliás, tinha a sua companhia em momentos completamente diferentes. Nunca estava sozinho. E mesmo que estivesse, tinha milhões de tarefas acompanhando os meus pensamentos do acordar ao dormir. Mas agora, ao fim de uma fase, não vejo outra companhia a não ser você. Não me ouve, mas chega até mim me proporcionando algum tipo de satisfação. E eu aqui a pensar, esperar, apostar em novos caminhos, e continuar a esperar. Esperas, promessas, vontades e bastões a me empurrar para trás o tempo todo. Esse livro se resumirá a isso, como o enredo batido de uma novela?

Talvez essa nuvem esteja com um cheiro fétido de solidão. Ou apenas aquela sensação atroz de ponteiros atrasados. Malditos ponteiros. Cansei de pensar nos problemas das engrenagens. Só quero fazê-los funcionarem.  

E continuo com a sua companhia. Me prendi. Fechei as janelas. Não desperdiço mais lágrimas vendo as mesmas artes, mesmo o coração behaviorista insistindo para que eu o faça. Não quero. Não irá mover nada, apenas esvaziar esse balão auto suficiente.

Malditos ponteiros atrasados... Logo as tecnologias mudam, e eles ficam de vez para trás, ainda tentando acompanhar o tempo. Antes tivessem caído, levado socos, experimentado todos os cantos do quarto, atrapalhado sonos, prolongado sonecas, brisando olhares e pensamentos, enfeitando a noite com sons. Teria história para contar. Não seriam apenas objetos, deixariam marcas.

Mas, tudo bem. Não adianta lamentar. Lamentos e pensamentos positivos só servem para vender bem. A prática os esnoba de maneira subliminar. O que estou dizendo? Ah, é você. Sabia que ia me entreter logo. E por isso que está aqui.

Não tenho mais o que dizer. Só continuar aí, na atividade, como cantava o saudoso Chorão... a minha adolescência deve muito à ele, ainda que deva mais a mim mesmo. Ah, meu caro, já está me confundindo as ideias. Pelo menos as minhas confusões se tornam mais divertidas e menos penosas, como sempre foram.

Agora vou me recolher. As horas passam, não têm pena de ninguém, muito menos de quem está parado na estrada. Tudo que não serve apodrece e vira adubo, até para os animais menos dignos de afeição.

Obrigado por me acompanhar, mais uma vez. Quem sabe um dia, teremos mais gente e mais motivos para celebrar a nossa companhia?

Boa noite. E repouse bem sob o calor do meu corpo. 

Danilo Moreira

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FOTO: Ultradownloads

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Sociedade virada


Centro de São Paulo, onze da noite. Numa esquina da Rua Aurora, um grupo de amigos, animados, cantava as mais patéticas músicas em meio a uma ciranda desengonçada. Logo, grupos de pessoas desconhecidas se juntaram à roda, e passaram a cantar mais alto. Cantaram de Ilariê à música do Jornal Nacional. Quem caminhava por ali chegava a parar, assistir e a tirar foto daqueles loucos.

Logo depois, no Palco Arouche, ao som de Sidney Magal com “Sandra Rosa Madalena”, desconhecidos formaram uma roda no meio do público, e uma moça, com uma rosa na boca, fazia performances engraçadas. Ela ia na direção de alguém e dava essa rosa na boca da pessoa. O(a) premiado(a), ia para o meio da roda, e também sensualizava. Do alto de um prédio, uma “biba” de cabelos brancos também dançava, mas com glamour. Quem estava em baixo reparou, e batia palmas, gritava, rasgava elogios irônicos. Foi então que, inesperadamente, um dos holofotes do show se voltou para a tal janela. Toda a plateia se virou, e começaram a ovacioná-la. A “biba” empalideceu, e sentindo-se uma lady, mandou beijos antes de entrar. Até o Magal a elogiou. Na verdade, naquela madrugada, não se sabia quem eram as maiores atrações: o cantor, a plateia, ou os moradores dos prédios ao redor.

O ano era 2010. Era a segunda vez, que eu ia ver a Virada Cultural no Centro de São Paulo. Foi uma noite animada, inesquecível, com boas atrações, ao lado dos amigos. Mesmo testemunhando um incidente (um rapaz roubou o boné de um homem e foi espancado por outros frequentadores), tinha valido a pena.

E ontem, me deparei com notícias de vários veículos sobre os episódios de violência na edição desse ano, a 9º, que contou com quatro milhões de pessoas, segundo a Prefeitura. Foram dois mortos, 17 prisões em flagrante, 12 roubos, 12 tumultos, seis pessoas esfaqueadas, nove menores presos e uma arma apreendida, conforme informações oficiais. Nem vou entrar em outros dados, como pessoas machucadas e arrastões, para não tornar o texto alarmista. É claro que casos violentos também aconteceram em edições anteriores, como em 2007, marcado pelo confronto entre público e PMs e que interrompeu o show da banda Racionais MC’s, na Praça da Sé. Mas confesso que esse ano, mesmo não tendo ido, me espantei com a quantidade de relatos de assaltos, arrastões, agressões, brigas e até a negligência de alguns policiais que presenciaram grande parte dos atos. Certamente, a incidência desses casos foi maior do que nas edições anteriores.

Não é novidade que quase todo evento aberto com grande público (ou não) acaba por atrair cenas de violência como as noticiadas. Mas dessa vez, a quantidade de relatos nos comentários dos sites, além do testemunho de vários repórteres que faziam a cobertura dos locais, me levou a pensar no grau de doença da nossa sociedade. Jovens usam o espaço público para explanar violentamente as suas revoltas e o seu desejo de “liberdade” por meio do consumo exagerado de bebidas e drogas. Outros, se aproveitam da multidão e da certeza da impunidade para “causar” terror e roubar o máximo de pertences possíveis (e nem o senador petista Eduardo Suplicy escapou dessa). E tem os clássicos: lixo no chão, depredação de mobiliário urbano, urina em qualquer canto, etc.

Em suma, um evento que deveria extrair o melhor do ser humano acaba por reproduzir as mazelas da sociedade atual, desde aos infratores “tocando o terror”, a pessoas de bem sofrendo traumas da violência e sendo obrigados a usarem o instinto de sobrevivência como se estivessem em uma selva. É claro que a Virada Cultural é muito mais do que o Centro. Existem outros pontos da cidade, bem mais tranquilos, onde toda a família pode curtir e de fato respirar cultura (como no SESC Interlagos – publiquei uma reportagem aqui em 2011 sobre a Virada no local). Mas a questão não é essa. O problema é ver um grande palco cultural como o Centro ser ofuscado por esses casos de violência.

Fica aqui a lição. A sociedade precisa de cultura. Mas antes disso, precisa aprender a ser uma sociedade. Não só nos hábitos e na Educação, mas nas cobranças ao Estado e no acompanhamento do que é feito pela cidade onde mora. Caso contrário, seja na Virada Cultural ou em outros eventos, a violência desmedida e impune continuará a se tornar a “atração principal”. 

Danilo Moreira

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Foto: acervo pessoal 
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