quarta-feira, 3 de julho de 2013

Ei, você é alienado!


Em alguns momentos, os ecos das manifestações produzem certas ressonâncias estranhas...

Domingo, enquanto corria o jogo entre Brasil e Espanha (que não me animei para assistir, mas acabei assistindo), observei nas mídias sociais um conflito curioso. Quem comentava sobre a partida, se manifestava como torcedor, comemorava a cada gol feito, virava alvo de certos indivíduos que se consideravam “legítimos lutadores por um país melhor”. E pensando bem, esse tipo de hostilidade é parecido com o que acontece com militantes de partidos, religiosos, e até quem apenas faz comentários simples de algum tipo de entretenimento (curiosamente, não vejo ninguém reclamar de quem curte atrações norte-americanas, por que será?). O negócio agora é ir pra rua, protestar contra todos os problemas do país, e não “relaxar” em nenhum momento.

Mas, quais são mesmo as pautas dos protestos em geral?

Dentre as várias, está a que é contra os gastos excessivos da Copa, a manipulação da mídia, e incentivar mais investimentos em Saúde e Educação. Certo. Agora, isso significa que ninguém mais pode gostar de futebol, curtir uma ficção, relaxar por algumas horas embarcando em algum tipo de história? Todos precisam, de uma forma que beira a neura, protestar contra tudo que está errado no país?

Essa forma radical de ver as coisas é um perigo para quem se diz consciente. Extinguir todos os partidos realmente vai acabar com a corrupção? Eliminar a Globo da face da Terra, como muitos sonham, vai mesmo diminuir a manipulação da mídia brasileira e deixar a população menos alienada? Não falar mais de futebol, não torcer a favor da seleção, não consumir qualquer tipo de entretenimento sob o receio do “vampiro da alienação”, vai mesmo tornar alguém mais consciente dos problemas do país? Extinguir as crenças religiosas vai tornar as pessoas com a mente mais aberta e totalmente livre de preconceitos? Protestar apenas na rua é a única forma de mudar o país?

Posso ter usado um tom até radical no parágrafo anterior, mas é assim que muita gente age, julgando a consciência política das pessoas apenas por uma pequena amostra dos seus gostos pessoais e crenças e pior, vomitando frases revolucionárias com certo ar de superioridade. Acho preocupante quando o desejo de mudar se torna um grito tão alto que não aceita opiniões de pessoas que até concordam, mas não são iguais àquela voz, ou não atuam no mesmo ritmo por conta de limitações ou por terem os seus próprios conceitos. Às vezes falam mais baixo, ou não falam – escrevem, cantam, se fazem ouvir de outras formas. E não pararam as suas vidas e nem deixaram de lado tudo aquilo que gostam por conta disso. Mas se elas estão engajadas na mesma luta e fazem por onde, a meu ver, isso é o que importa.

Se for seguir esse pensamento radical, ninguém que participou e participa dos protestos poderá torcer pelo seu time de coração, nem assistir ou comentar sobre qualquer tipo de entretenimento que gosta de assistir para relaxar. Aliás, para que consumir entretenimento, quando se tem um país inteiro para mudar? E aí que entra o ponto principal: alguém por acaso realmente faz isso? Ah, hipocrisia detected.

Os únicos, a meu ver, que realmente seguiram à risca esse tal “padrão de vida pró-luta” foram os militantes que no começo dos anos 70, auge do regime militar e da repressão, foram para a luta armada. Abandonaram as suas famílias para viverem clandestinamente, em condições precárias, respirando a causa e sofrendo as consequências 24h por dia. Mas não vivemos exatamente aqueles tempos e nem, por enquanto, somos obrigados a frear completamente nossas vidas para lutar contra as causas (Quais mesmo? Você se lembra de todas?).

Precisamos aprender a separar o joio do trigo. Nem todo mundo que é fanático por futebol, consome determinados entretenimentos, possui alguma crença religiosa, ou atua em algum partido, é necessariamente O alienado. A alienação começa quando tudo isso é posto acima dos problemas do país como uma forte anestesia. E é claro que existe gente assim e que precisa acordar com urgência. E não é indo para a rua. Antes disso, é aprendendo a pensar. Ir à rua ou às mídias sociais como um robô que repete frases revolucionárias feitas, pra mim, não é protestar, e posar com uma consciência que na verdade não amadureceu.

Em outras palavras, devemos tomar cuidado para que esse pensamento tão radicalista (e que felizmente ocupa a cabeça da minoria) não continue a reforçar, agora sob o pretexto da gana de mudança, as mesmas manias de rotulações, julgamentos e preconceitos a que todos nós somos submetidos, de uma forma ou de outra, no dia-a-dia. É o velho ditado de não deixar se levar pelas aparências.

A ideia aqui não é defender a Globo, as religiões, a Copa ou determinados partidos, mas sim, fazer pensar até que ponto boa parte do povo acordou. Muitos sabem que precisam gritar para mudar alguma coisa, mas no que diz respeito a pensar primeiro antes de falar, o sono ainda pode estar profundo...

Danilo Moreira

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FOTO: http://www.artigosecronicas.com.br/o-perigo-de-apontar-o-dedo/ (Google)

Um comentário:

Tati disse...

Achei as manifestações legítimas justamente por não envolver um partido específico, e a falta de "foco" me parece mais um repeteco da mídia do que o entendimento próprio. Tanto, que as tarifas dos transportes públicos voltaram aos preços anteriores e muitas leis que estavam em processo de aprovação [leis estúpidas] foram devidamente arquivadas.

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