segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Sobre novelas e umbigos



A novela global “Avenida Brasil”, de João Emanuel Carneiro, é certamente um sucesso da teledramaturgia recente. A história protagonizada por Nina (Débora Falabella) e Carminha (Adriana Esteves) tem rendido à Globo, nas últimas semanas, picos que beiram os 50 pontos de audiência, índice que nem últimos capítulos de outras novelas conseguiram atingir.

Por conta dessa repercussão é inevitável que o assunto seja mencionado nas redes sociais. O que chama a atenção é a crítica hipócrita por parte da turma que se considera “consciente” em cima de quem vê novelas. Afirma-se, de maneira geral, que ela é um instrumento de manipulação, e quem as assiste são pessoas “fúteis”, “alienadas” e que “não se importam com a política e o que acontece no país”.

Hipócrita sim. Tão hipócrita quanto quem diz que não assiste novela por ser pura ficção, mas chora só em saber que um novo livro da saga Crepúsculo vai ser lançado. Tão hipócrita quanto quem diz que o povo “se droga” com as novelas, mas que deixa de ir trabalhar para ver a partida de futebol do seu time. Tão hipócrita quanto quem fala que assistir novela é fugir da realidade, mas que conta os dias para assistir seriados americanos como “The Walking Dead” e realmente acredita que vai haver um “apocalipse zumbi”. Tão hipócrita quanto aqueles que criticam quem compra bijuterias semelhantes às usadas pela protagonista da novela, mas enche o quarto de posters, revistas e objetos que lembram o seu cantor ou banda preferidos. Tão hipócrita quanto quem critica UFC como estímulo a violência, mas assiste desde pequeno filmes de luta às vezes mais sangrentos. Tão hipócrita quanto quem prega o boicote à Globo por ela ser manipuladora, mas assiste atrações da Record e outras concorrentes que não passam de cópias mal feitas da “Vênus Platinada”, e às vezes, até mais apelativas e desumanas.

Vivemos sim em um país que precisa acordar para a sua realidade e acompanhar mais o trabalho dos governantes. E instrumentos para isso não faltam. Aqui em São Paulo, por exemplo, a Câmara Municipal possui um portal onde é possível até assistir ao vivo as Sessões Plenárias, saber o andamento de projetos importantes para seu bairro, ou ainda, acompanhar o trabalho e assiduidade do vereador que você escolheu. Você sabia disso, leitor? Se você é de outra cidade, já verificou se aí existe esse recurso? E sobre o trabalho do governador do seu Estado?

Agora, não consigo imaginar um mundo onde as pessoas apenas usem a televisão para assistir programas que discutam a realidade e a sociedade em que vivemos. E não tiro o mérito de desse tipo de conteúdo. Ele é importante. Precisa existir. Só que parece que falar de puro entretenimento virou pecado. Você não pode deixar um pouco de lado a sua realidade para embarcar em uma trama, seja ela qual for, que logo é estereotipado como alienado. Ora, se for por essa linha, todos nós então o somos. Todos, sem exceção.


É possível equilibrar. Você pode ser um cara que assiste "besteiróis" adolescentes americanos mas que sabe, por exemplo, o que o seu prefeito tem feito pela sua região. Mesmo sabendo que a novela é um produto feito para vender outros produtos, eu gosto. Assisto. Curto ver a narrativa, a construção dos personagens, rir com eles. Nem por isso, me considero um “robô manipulado pela mídia”. Sei que existem pessoas de fato alienadas, que realmente levam à sério coisas que não deveriam passar da tela da TV. E é errado. Mas culpar simplesmente um único produto pela alienação de um povo é algo impreciso. A mídia manipula, mas, cada pessoa tem o seu gosto, a sua forma de receber as informações e como vai usar aquilo para a sua vida. Assim como eu não acredito na consciência política de uma pessoa que pede voto nulo mas não se lembra em quem votou nas últimas eleições, não acredito que as pessoas que criticam as novelas como "o ópio do povo" também não consumam algo similar, mesmo que não seja brasileiro.

Busque o equilíbrio. Ninguém deve viver só de realidade ou de ficção. E pior, quem valoriza demais determinado produto midiático é o primeiro que deve baixar a cabeça e se atentar melhor àquilo que fala sobre o consumo dos outros.

E por fim, quem critica a tudo e a todos também é um alienado. Pois jamais será capaz de sentir orgulho de alguma coisa, e não sairá do senso comum de que “tudo está errado”. Quem realmente é inconformado com a sociedade berra menos e atua mais, pois almeja ver mais resultados do que problemas. E quem realmente é alienado está se lixando para essa discussão, e também tem a mesma linha de pensamento do “tudo está errado”, por isso, não sairá do seu sofá para se impor e muito menos para reclamar.

Em suma, vamos cuidar mais dos nossos umbigos e ser menos hipócritas. A sociedade já doente de egos e visões mal construídas agradece. 

Danilo Moreira

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FOTO: 
http://www.dtvusaforum.com/blogs/orrymain/189-director-mel-stuarts-death-brings-memories-willy-wonka-pure-imagination.html
http://www.tribunahoje.com/noticia/42409/entretenimento/2012/10/11/passado-negro-de-doroteia-vem-a-tona-em-gabriela-dancava-nua.html
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