segunda-feira, 28 de maio de 2012

Sons especiais na praça de alimentação


Já tinha ouvido aquela voz algumas vezes naquela praça de alimentação do Shopping Light, no Centro de São Paulo. Todas as noites das sextas-feiras, com seu violão e uma voz afinada, aquele rapaz desconhecido tocava em um pequeno palco improvisado e mal situado. Na bagagem, um repertório variado, com clássicos da MPB e conhecidas baladas internacionais. Disputava com seu talento um pouco de atenção das pessoas em meio àquele barulho misturado de conversas e talheres. Ao fim de uma música, ouvia uma, duas palmas, e agradecia discretamente com a cabeça.

Mas, naquele dia, enquanto eu me acomodava em uma das mesas com meu jantar, reparei que uma senhora bem idosa, negra, com um lenço elegante na cabeça, batia palmas com mais empolgação que os demais. Ela estava bem na frente do músico, sozinha, e pelo prato vazio, já tinha comido há algum tempo. O rapaz tinha acabado de tocar “Do you wanna dance?”, de Johnny Rivers, e ela, comovida, pediu mais. E ele, não dando muita atenção, continuou com seu repertório, com clássicos de Eric Clapton, Nando Reis, Djavan, Richard Marx, entre outros. Ao fim de uma música, o cantor foi aplaudido euforicamente pela senhora, e surpreso, enrubesceu-se. A mulher então chamou o rapaz de canto e sussurrou alguma coisa em seu ouvido. Ele sorriu. Então, pôs-se a tocar uma música que ela tinha sugerido, do Lionel Ritchie. E assim foi com outras.

As mesas em volta já começavam a ficar vazias por conta do horário de fechamento do shopping. Eu ainda comia bem devagar, apenas obervando os dois, curioso com a forma que se interagiam. A mulher sorria, batia palmas, brincava e acompanhava os gestos do rapaz, como se mesmo sentada também fizesse parte daquele palco. E ele ia junto, animado com a atenção especial que recebia, deixando que ela escolhesse, ao fim de cada música, qual a próxima a ser cantada. A apresentação, com finalidade de puro entretenimento, agora tinha ganhado um novo significado: ele fez a diferença na vida de uma pessoa, transformou aquele momento em algo inesquecível para alguém. E pelo brilho que seus olhos mostravam, isso já parecia o suficiente para deixá-lo satisfeito.

Olhei no relógio, vi que precisava ir embora. Passei ao lado do palco só para ver mais de perto aqueles dois. A senhora ainda continuava cantarolando, e o rapaz terminava de tocar mais uma música do Johnny Rivers. Era a última. Com toda a educação, despediu-se do público, deixando seu telefone para shows. A senhora o aplaudiu de pé, deu-lhe parabéns, agradeceu por tê-la feito se divertir tanto. Sorridente, o rapaz também a agradeceu por tê-lo ouvido.

São em casos assim que a gente percebe como não precisa de muito para transformar dias comuns em momentos especiais.

Danilo Moreira

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FOTO: http://aldeiatem.com/blog/?p=2999
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