terça-feira, 27 de outubro de 2009

Águas Calmas


Tive a chance de navegar em águas calmas.
Deitei-me no chão e passei a observar todas as coisas.
Senti o meu coração batendo. Senti o ar que respiro.
Estiquei as pernas e deixei-me flutuar na brisa dos meus pensamentos.
Quero sentir-me voando como o vento.
Poder mexer-me pelo mundo conforme eu quiser.
Refrescar os outros rostos suados do calor escaldante e cruel.
Fazer algo em prol da bandeira dos meus sonhos.
E sempre, quando precisar, saber abrir os braços.
Sei que essas águas calmas tem um prazo.
Pois mesmo que eu volte a navegar pelo oceano selvagem e tempestivo.
Desejo que essas águas calmas estejam sempre a forrar a minha alma.

Dentro de mim...

Danilo Moreira

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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Alá no Gueto

“Cinco vezes ao dia, os olhos ultrapassam o concreto de ruas irregulares, carentes de esgoto e de cidadania, e buscam Meca, no outro lado do mundo. É longe e, para a maioria dos brasileiros, exótico. Para homens como Honerê, Malik e Sharif, é o mais perto que conseguiram chegar de si mesmos. Eles já foram Carlos, Paulo e Ridson. Converteram-se ao islã e forjaram uma nova identidade. São pobres, são negros e, agora, são muçulmanos. Quando buscam o coração islâmico do mundo com a mente, acreditam que o Alcorão é a resposta para o que definem como um projeto de extermínio da juventude afro-brasileira: nas mãos da polícia, na guerra do tráfico, na falta de acesso à educação e à saúde. Homens como eles têm divulgado o islã nas periferias do país, especialmente em São Paulo, como instrumento de transformação política. E preparam-se para levar a mensagem do profeta Maomé aos presos nas cadeias. Ao cravar a bandeira do islã no alto da laje, vislumbram um estado muçulmano no horizonte do Brasil. E, ao explicar sua escolha, repetem uma frase com o queixo contraído e o orgulho no olhar: ‘Um muçulmano só baixa a cabeça para Alá – e para mais ninguém’.”

Fonte: site Revista Época


É por isso que eu sou da opinião de que você deve pensar duas vezes antes de jogar algo fora, pois no futuro, isso pode lhe ser útil. Se você for blogueiro então, aí sim é que eu te recomendo este conselho.

Estava eu hoje a arrumar a minha cama, quando ao olhar para um amontoado de revistas, encontro uma Època de fevereiro desse ano, que eu tinha ganhado de brinde daqueles promotores de vendas. Dentre as várias chamadas, uma em tamanho minúsculo me chamou a atenção. Falava de um fenômeno que estava ocorrendo principalmente na periferia de São Paulo.

Ao abrir na matéria, vejo um rapaz bem típico da periferia, com pose e gestos de “mano”, adepto da cultura hip hop, mas com aquele chapéu e a barba que os mulçumanos usam. Seu antigo nome era Carlos Soares Correia, mas após se converter ao islã, passou a se chamar Honerê Al-Amin Oaqd. Hip hop e religião muçulmana... que mistura!

A matéria é extensa. Mostra que a origem dessa identificação dos negros brasi-leiros atuais com o islã remonta um evento pouco retratado nos livros de história, que foi a revolta dos malês (malês significa muçulmano na língua iorubá) na Salvador de 1835, que foi a revolta de escravos urbanos mais importante da história brasileira. Aliado a isso, veio a história de Malcom X (ativista americano), retratado principalmente no filme de Spike Lee em 1992, e principalmente, após do 11 de setembro, que levou muitas pessoas a conhecerem o islamismo.

Segundo alguns entrevistados, é uma forma de recuperar uma identidade reprimida pela escravidão ou ter uma identidade da qual possam se orgulhar. Um dos entrevistados, Ridson Mariano da Paixão, de 25 anos, justifica também essa conversão pelo fato de que outras religiões, como a católica, pregam uma pacificidade que não caberia à sua realidade. Conforme ele diz, “me incomodava aquela história de Cristo perdoar tudo. Eu já tinha apanhado de polícia pra cacete. E sempre pensava em polícia, porque o tapa na cara é literal. Então, o dia em que tiver uma necessidade de conflito, vou ter de virar o outro lado da cara?”. Ele afirma que não possui esse espírito pacifico e que se identifica mais com Malcom X, que descobre que no islã nos temos o direito de nos defender.

Na verdade esse movimento existe há mais de trinta anos, surgida nas mãos de pioneiros, como por exemplo, seu Malma, que fundou a Mesquita Muçulmana Afro-Brasileira em 1974, ou como a Dona Ilma, que nasceu em um quilombo e é convertida há mais de vinte anos. Mas nem todos dessas gerações mais antigas são favoráveis a essa mistura de hip hop e o islã, como a própria Dona Ilma diz na matéria: “O islã sempre trouxe cidadania para as minorias. E as periferias são as senzalas de hoje. Mas as novas gerações têm muito punho ainda, tenho medo que acabem sendo segregacionistas”, e que “Não precisamos mais de um discurso de raça, precisamos de cidadania. Acredito, porém, que é um ritual de passagem. Quando me converti, também era muito radical. Vamos deixar eles gritarem um pouco.”

Confesso que entendo muito pouco dessas religiões do mundo árabe, mas me chama a atenção essa necessidade de identificação dessa parcela da periferia e da forma rápida como ela está se propagando pelos quatro cantos do Brasil. Quem lê a matéria à principio pode pensar que esse movimento é algo fechado apenas aos negros, mas não, na própria matéria, vários lideres e pessoas convertidas deixam bem claro que é algo aberto para qualquer pessoa. Ou então, que estamos “criando novos Bin Ladens”, conforme eu vi depois no site, em vários comentários arrogantes e até preconceituosos.

Não. Apesar de eu ter minhas criticas em relação à luta racial e a religião (mas isso é assunto pra outras postagens), e não concordar tanto com certos pensamentos que na minha opinião podem vir a criar deturpações justificando o uso da violência ainda que como defesa (que no fim das contas sempre gera mais violência) percebi que a intenção na verdade é a de buscar uma identidade cultural e um conforto espiritual que os ajude a combater a desigualdade racial que os acompanha todos os dias, desde que nasce-ram, e que infelizmente ainda continua a produzir os machucados dentro da nossa sociedade.

E você, o que acha dessa mistura entre cultura da periferia e o islã?

A matéria completa você vê aqui, no site da revista Época:

Ou, algo mais resumido, aqui, no site do Estadão:

Bom resto de feriado a todos!

Danilo Moreira


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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Vany


Me lembro daquela casa cheia, todos na cozinha, conversas altas, gargalhadas, enquanto passava o Domingão do Faustão naquela velha televisão preto e branco.

Eu, uma criança pequena, curiosa, e senhora, já adulta, baixinha, gordinha, de personalidade forte. Me lembro do seu tom de voz agudo, bonito, bem feminino. Me lembro das suas gargalhadas.

Me lembro das histórias que me contava da sua juventude. Me lembro de ouvir os lugares que a senhora frequentava no Santa Cruz e na Vila Mariana antes do metrô (e na sua opinião, me lembro, os bairros nunca mais foram os mesmos depois da chegada dele.)

Me lembro das histórias da fábrica de chocolates onde a senhora trabalhava, quando subiu de setor, dos chocolates que sempre me trazia. A mim, aos vizinhos, a todos. Me lembro do seu coração de mãe, mesmo nunca tendo tido filhos, e me tratava como um filho seu. Tratava a mim, às meninas da vizinha, aos seus sobrinhos da vila Mariana, os meus irmãos, o seu irmão de criação surdo e mudo. E cuidava mesmo! Dava broncas, conselhos amorosos, puxões de orelha, falava mesmo, ou então, nos botava para cima, fazendo a gente rir mesmo quando a gente estava murcho. Me lembro do seu sorriso quase presente em todas as fotos que tirava. Me lembro do seu coração enorme, não hesitando em ajudar quem precisava, e quem a senhora amava. Me lembro da sua teimosia, e que teimosia!

Me lembro que a senhora estava em todas. E me levava para todas. Estava em todas também aqui em casa, no Natal, Ano Novo. E quando viajávamos para a praia? Não saia da água, assim como eu. Quando íamos para a igreja, do tempo em que eu a freqüentava direto. A senhora não tinha vergonha da sua fé. Cantarolava as músicas bem alto, com uma certa afinação, com tanata devoção, a fé realmente sempre te acompanhou.

Me lembro nos finais de tarde daquele cafezinho que, mesmo eu precisando ir embora, a senhora fazia questão que eu tomasse. Um café com leite e pão. Me fazia companhia. Eu também por muitas vezes te fiz companhia. Até, em certos momentos, mesmo tão inexperiente da vida, fui por acaso o ouvido que precisava para lhe escutar.

Me lembro dos seus problemas de saúde. Dos problemas causados pelo seu trabalho na fábrica. Me lembro do dia em que, já almejando a sua aposentadoria por tempo de serviço, uma supervisora acabou distanciando o seu sonho... e graças a isso, ao meu ver, sua vida nunca mais foi a mesma...

Me lembro da sua correria para se aposentar. Das ilusões com advogados, com as horas de espera, com as dores e as raivas que passou no INSS. Até que veio aquele dia... um médico maldito e antiético, que a fez ficar tão nervosa, mas tão nervosa e desesperançosa, que acabou abalando a sua mente...

Me lembro dos dias em que te via muda. Me lembro do tormento que era te ver muda. Me lembro do sofrimento que foi vê-la imóvel, depressiva. Me lembro da recuperação, do primeiro surto (causado por certas pessoas de quem a senhora acabou confiando demais).

Me lembro da sua recuperação, das minhas paranóias, do meu medo em não saber lidar com a sua situação, mesmo eu já adulto. Me lembro da sua felicidade, após quase 8 anos, conseguir finalmente a sua aposentadoria.

E principalmente, me lembro de seu último surto. Um surto tão grave, que também quase me fez surtar... a mim e principalmente à minha mãe, que passou a cuidar da senhora. Me lembro da dor que era te ver naquele estado, e da dor que foi de ter chegado ao ponto de ter que interná-la numa clínica. Me lembro do alivio que foi encontrar uma, e da certeza de que dessa vez a senhora conseguiria se recuperar da depressão...

E por fim, me lembro daquela noite, em que chegando do trabalho, recebi a noticia que menos esperava receber naquele dia, e que até hoje tento aceitar da forma como foi. Seu coração subitamente parara de funcionar. Sua mente, tão atormentada por alucinações e lembranças, teve um descanso eterno.

A senhora descansou.


Agora, me pergunto, por que é tão difícil lidar com perdas? Por que nós seres humanos nos acostumamos tanto com a vida, que em certos momentos, ela nos taca na cara sem dó nem piedade que além dela, existe a morte?

Hoje, sigo minha vida. Estou fazendo a minha faculdade, que como a senhora sabia, eu queria tanto fazer. Já sonhei como teriam sido as coisas se a senhora tivesse voltado daquela clínica. Sonhei com momentos antes da clínica. Sonhei com momentos no dia em que deixara a clínica para se juntar aos anjos... e derramei lágrimas... lágrimas de dor... uma dor tão forte, que lentamente, vai se cicatrizando, ainda que a marca do machucado, tenho certeza, ficará para sempre em mim.

Hoje faz um ano que partiu. Como estará? Onde estará? Não importa. Tenho certeza de que muito melhor do que eu, do que todo mundo neste mundo. Só peço pra continuar intercedendo por mim, pela nossa família, por todos que a amaram e até hoje não se esquecem do seu sorriso. Seu cãozinho está velho, triste, mas ainda resiste até o dia em que Deus quiser. Seu irmão de criação, surdo e mudo, agora mora sozinho na casa, que agora está silenciosa, ainda com a sua marca, ainda com a sua lembrança, mas fique tranqüila, que ele está aos cuidados da minha mãe, que também é irmã dele, e agora, se tornou a sua mãe.

Ainda sinto a sua falta. Ainda sentirei a sua falta. Todos nós sentiremos a sua falta. Sei que um dia todos nós vamos nos reencontrar. Até lá, fique com Deus, e obrigado por existir, seja em presença, seja através do seu exemplo...

E pode ter a certeza, que seu espaço no meu coração estará sempre reservado, com tamanho carinho que a senhora sempre me proporcionou, mesmo nos momentos em que sua mente não a acompanhava mais...

Fique em paz...

de seu sobrinho.

Danilo Moreira


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FOTO: Acervo pessoal
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