domingo, 13 de setembro de 2009

Uma Corda no meu Caminho


Nunca tinha reparado naquele caminho.

Marcelinho achou estranho. Estava cheia de árvores em volta. Parecia a entrada de um parque. Resolveu chegar mais perto para ver melhor. Havia uma corda na entrada. Estava fechando a passagem. Pelo jeito, não era para entrar ali.

Ficou curioso para saber o que havia além daquela corda.

Olhou para os lados. Não tinha ninguém à vista. Se passasse por cima ou por baixo, não haveria problema algum. Optou por passar por baixo.

Agachou-se. Deu mais uma conferida para ver se não havia ninguém por perto. Com cuidado para não se machucar nas pedras, foi se arrastando para debaixo da corda grossa.

Mas, de repente, sentiu algo estranho dentro de si. Voltou. Olhou bem a corda grossa que fechava a entrada de um lado a outro. Por que aquela corda estava ali?

Marcelinho se sentiu incomodado, como se aquela corda fosse um daqueles meninos folgados da escola a lhe peitar. Um desaforo. Aquela corda encarnara-se num desaforo aos seus olhos. Tinha curiosidade em saber o que havia lá dentro, e aquela corda era o empecilho, o obstáculo. Um obstáculo que teria que ser tirado.

Resolveu então forçá-la com seus braços. Tudo bem que para um garoto de dez anos soltar aquela corda com a simples força dos braços poderia ser algo quase impossível, mas o garoto acreditava na sua força ainda em crescimento. E empurrou. A corda estava presa em duas toras de ferro fincadas no chão. Marcelinho começou a pôr mãos força, à medida que a corda ia sendo prensada para frente.

E nisso, ficou, no mesmo estado.

Marcelinho parou. Cansaço. Não foi uma boa idéia. Olhou para as mãos. Estavam vermelhas de marcadas pela força que havia usado.

E então, cheio de ego, encarou novamente a corda. Teve a idéia de tentar rompe-la com os pés. Com o pé direto, forçou a corda. Da mesma forma que na primeira tentativa, a corda prensou-se para frente.

E a corda ficou no mesmo estado.

Começou a chutá-la, na esperança de com a sua força e velocidade unidas, a corda por fim seria rompida. Não deu certo.

Teve outra idéia. Já que a corda era forte no meio, e se ele fosse nas pontas tentar desamarrá-la? E foi o que ele fez. Na ponta direita, tentou desamarrar o os nós que estavam ali fincados na tora. E estava duro. O cara que havia feito aquilo devia ser um brutamontes com muita força nos braços. E com as unhas, o garoto tentou desamarrar os nós. Não conseguiu. Foi para o lado esquerdo. Também não conseguiu.

Eram nós muito bem feitos.

E então, Marcelinho, cansado, resolveu por um momento sentar no chão para tomar fôlego. Percebeu que com as mãos não conseguiria romper aquela maldita corda. Precisava de uma ferramenta. Teve uma idéia. Foi até em casa, e escondido dos pais, pegou uma faca de cozinha. Voltou até o local da corda. Sem pensar duas vezes, começou a cortá-la. E forçou, forçou, forçou... aos seus olhos nem o primeiro fio havia sido cortado. Aquela corda era forte mesmo.

O sangue subiu à sua cabeça. Não era possível que mesmo depois de tantos esforços, não conseguiria tirar aquela corda do seu caminho.

E, num ataque de fúria, tentou novamente cortá-la, dessa vez esfregando a faca com toda força que podia. Tanta força que ela acabou escorregando, indo parar diretamente no seu dedo. Olhou sua mão. Por sorte, fora apenas um pequeno corte. Chupou o sangue. Virou-se para a corda, e com todo o ódio do mundo, xingou-a com vários palavrões. Descontrolou-se, e começou a chutá-la. Numa dessas, escorregou e caiu sentado no chão. Bufou. Não tinha jeito. Aquela corda ficaria naquele lugar, e não sairia da sua frente.

Marcelinho sentiu-se frustrado consigo mesmo, um incapaz, um nada. As únicas coisas que conseguiu foram um machucado no dedo, e um tombo. Mais nada. Ego ferido.

E de repente, do outro lado da rua, eis que surge Manoel, amigo de Marcelinho, um dos garotos mais bobos e mais zombados da escola.

- Nossa, o que é isso? – surpreendeu-se o garoto ao ver aquele caminho misterioso. –

Vamos lá, cara! O que você tá fazendo aí parado no chão feito um bobo?

E assobiando, passou tranqüilamente por debaixo da corda, coisa de apenas um segundo.

Marcelinho olhou aquela cena, e ficou pasmo. Por um momento, o objetivo de cortar a corda, de tirá-la do seu caminho, o regou tanto que ele se esqueceu de que simplesmente, era só passar por baixo dela. E o problema estaria resolvido.

Era, simplesmente, culpa do seu ego.

Danilo Moreira


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FOTO: http://lh6.ggpht.com/_qlNp6BSNItc/SkDtLAORHYI/AAAAAAAAAlc/b6IzN2fCiFs/Egocentrico232_thumb%5B4%5D.jpg


3 comentários:

Hugo de Oliveira disse...

Adorei o texto...ótimo.

abraços


Hugo

Marcelo A. disse...

O ego. Quase sempre ele...

Gostei da figura. O menino de dez anos investindo contra uma simples corda. Era tão mais fácil simplesmente se agachar e atravessá-la por debaixo, né? Era, mas o ego não deixou.

Quantas vezes não agimos igual ao Marcelinho? O problema é que, ao contrário dele, não temos mais dez anos. Essa é a diferença. Envelhecemos só no RG, nas atitudes, nos comportamos como crianças...

Valeu pelo comentário, Danilão! E parabéns pela postagem! Está ótima!

Abração!

Bruno Silva disse...

É incrivel como as vezes você me interpreta melhor que eu mesmo. Muito obrigado por sempre ser essa pessoa fantastica, que torna as palavras, mais dignas e felizes.

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